Corre Cotia - Doutorado com sua Tia

Às vezes eu fico pensando porque as pessoas saem correndo desembestadas atrás de títulos acadêmicos, se a área acadêmica não tem a ver com elas. Isso significa que, obviamente, o trabalho de dissertação ou tese não será necessariamente um trabalho de dissertação ou tese, porque faltará seriedade. A pressa é inimiga da perfeição. É um ditado que persiste e persistirá. Eu fico boba de ver teses de doutorados tão fracas e uma consensualidade da banca acadêmica montada para aprovar porque, veja bem, reprovar compromete mais a instituição do que o aluno.

Outro dia eu estava esperando um amigo, um destes professores doutores de médio-grande porte, terminar uma banca de qualificação de doutorado, que deveria durar umas duas horas mas que levou bem umas cinco. Ele saiu sozinho da sala e eu estranhei. Perguntei porque estava demorando tanto e a resposta: "ah, Fê, o trabalho está muito ruim. Eu disse que por mim reprovaria, mas prazo do cara está estourando e se a gente reprova a faculdade perde pontos na avaliação da Capes.". E é claro que não se pode perder pontos tão preciosos porque é mesmo uma corrida maluca.

No dia seguinte encontrei o cara que fora submetido a esta banca e, curiosa, quis saber a versão dele para a demora na sua qualificação: "ah, Fê, é assim mesmo, eles encanam com umas coisinhas bobas, mas no final eles sempre passam a gente!". Noooossssaaaaa, muito sábio este ser, jesuis! Só de pensar que este fulano é doutor me irrita. O problema é que isso não é um caso isolado. Um dia, alguém disse que é possível se fazer um doutorado em apenas dois anos e este ficou estabelecido como tempo mínimo. Tá, eu concordo que um aluno genial faz uma tese de doutorado em seis meses se ele quiser. Um aluno genial, Albert Einstein talvez. Não um Zé Mané atrás de um título. Este, em dois anos, dando aulas na faculdade, fazendo um bico aqui outro ali para sobreviver, fará mesmo um trabalho meia-boca.

Outra banca (de um conhecido) com este meu amigo professor: "Fê, minha vontade era de reprovar, muito fraco o trabalho dele para um doutorado. O cara nem fez estudo piloto.". É, academicamente a universidade está um lixo. Eu já suspeitava disso na graduação. Quando eu fiz minha monografia, disseram que era uma dissertação de mestrado. Eu levei um susto. Quando eu fiz minha dissertação de mestrado, disseram que era uma tese de doutorado. Eu levei um susto ainda maior. Eu demorei dois anos para entrar no doutorado porque eu tive que deixar meu projeto mais fácil para que alguém topasse me orientar. É cruel ouvir em ocasião de entrevista que "seu projeto é muito bom, mas é tão difícil como sua dissertação". Afinal, não era de doutorado de que tratávamos?

Mas o mundo acadêmico é endogâmico. Lembram? Professores se acasalam com professoras e geram professorinhos. É claro que meu amigo professor doutor não pode reprovar alunos porque ele se encontra numa sinuca de bico, como diria meu avô. O mundo acadêmico é uma grande família e os professores têm que ajudar e não complicar. Tenho uma colega que é surpreendente. Se formou na graduação, casou no ano seguinte, entrou no mestrado, pariu e ficou com a bolsa pra cuidar do bebê. Terminou o mestrado, entrou no doutorado, pariu e ficou com a bolsa para cuidar do bebê. Mas também, tudo tão fácil quando você escolhe a banca certa. É a vida...